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quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

O texto abaixo escrevi para dedicar a uma amiga, que saberá quando o ler.


A MULHER QUE EXERCE O PODER ATRÁS DO TRONO

*Simone Cabral

Deus fez para o homem um trono. Para a mulher, um altar” disse o poeta e escritor Francês do século XIX Victor Hugo. Reveladores daquilo que os modelos tradicionais de relações de gênero colocaram para homens e mulheres, trono e altar são representações simbólicas do papel que ambos ocupam na vida social: a mulher, o papel de frágil, de submissa, da virtude extrema e imaculada; O homem, de sexo forte, dominador, viril e detentor de poder. É o domínio masculino que prevalece no campo do discurso, da linguagem e na determinação das formas de estar e ser mulher. A linguagem é, pois, a maior expressão destes condicionantes.

Não raro, escutamos: “Por trás de um grande homem, tem sempre uma grande mulher”. Ainda que substituamos o “Por trás” pelo “Ao lado”, refere-se apenas ao reconhecimento da suposta capacidade intelectual da mulher, embora isto necessite estar atrelado à condição da dependência masculina. Típico de clichês que banalizam as relações sociais é mais uma característica de uma aparente igualdade, ficando para a mulher a condição de retaguarda dos homens. Mas seria então o momento da mulher assumir posturas masculinas? Digo que não. Na verdade, pensando estar afirmando a sua condição emancipatória, está reproduzindo a dominação masculina como a que se revela no ideal feminino de “Paraíba masculina mulher macho sim sinhô”.

Diferente desta posição, mas que se confunde com o domínio do campo afetivo e das emoções que se diz caber às mulheres, está o da sedução. Aliás, muitos fatos e acontecimentos históricos tem se justificado em função de certos construtos que atestam que algumas mulheres usaram seus encantos para conquistar o poder, a exemplo de Cleópatra, Helena de Tróia, Salomé, Eva etc.

Não por este motivo, mas pensando nos movimentos sutis, particular ao jogo da sedução, é que muitas mulheres tem conseguido se impor em suas relações, especialmente, as pessoais. É um “faz que mostra e não mostra”; provoca os sentidos muito mais do que aquilo que é explícito.

Para além de uma sombra (o que a mulher pode se tornar), contraparte inconsciente inferior que recusa significado e reprime o sentimento, dar-se margem a posição de um ego feminino voltado para objetivos da identidade, reconhecimento e poder. Estamos falando da mulher que exerce o poder atrás do trono. Aquela que consegue ocultar o seu interesse, utilizando-se de várias artimanhas para conseguir o que deseja.

Sem conflitos, sem confronto direto sabe, e, sabiamente, prevalecer a sua vontade, que vai se concretizando aos poucos, quase de forma natural e espontânea. Suas estratégias combinam a sutileza de seus atos e o jeito manso de falar com a forma calculista e controlada do seu modo e tempo de agir.

Paulatinamente, ganha espaço e faz ouvir na relação, embora, ocultando, muitas vezes, que é o sujeito falante. Consegue o que quer pelo movimento sutil das suas ações, da sua fala, dos seus gestos. Sem exageros, quase que por enganação. Não que isto se revele como malícia, eu diria, astúcia.

De aparência cândida e terna, esconde um jeito de ser austero, determinado e comprometido. Está longe de ser uma mulher fútil. É dedicada ao trabalho, ao companheiro, aos filhos, ao lar. Em ambos papéis, mantêm o equilíbrio e a serenidade que lhes convêm.

Pois bem, a mulher que exerce o poder atrás do trono, não pode ser confundida com a que padece da submissão e obediência ao homem, meio que anulativa da sua identidade. Sua forma de ver, pensar e agir dosa com propriedade razão e emoção, culminando na estabilidade da relação, e obviamente, na satisfação pessoal. Ela busca o seu reconhecimento, o seu espaço e a sua afirmação sem perder a ternura jamais.

Um comentário:

Unknown disse...

Simone,

É impossível que alguma mulher determinada a alcançar seus objetivos (que algumas vezes contrariam normas estabelecidas por antigos preceitos) não se veja no seu texto, que para mim, soa como uma obra de arte. Arte da escrita com jeito de melodia. Na certa, sua amiga a quem homenageia, se sente honrada pela sua inteligência, perspicácia e capacidade de análise. Mas não somente ela... Muitas mulheres se verão refletidas em "A mulher que exerce o poder atrás do trono". Parabéns!!!