Uma reflexão sobre o dia I8 de maio:
* Eliene Liberato
Ao percorrer a história da humanidade, os relatos sobre o Abuso e a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, não figuram no cenário dos grandes problemas sociais. As causas dessa omissão são múltiplas, entre elas: situação histórico-cultural, sociedade patriarcal, valores morais distintos dos atuais, dentre outros. Isso, no entanto, não desqualifica esse fato como um grave e nefasto crime não só contra Crianças e Adolescentes, mas a todo o corpo social, representando um ataque aos valores mais nobres de uma sociedade.
Após a Revolução Francesa, rompe-se com os velhos paradigmas e inaugura-se uma era de liberdade individual, democrática e atenta aos Direitos Humanos.
Somente no fim do século XX a violência sexual contra crianças e adolescentes ganha dimensão relevante na agenda pública internacional, sobretudo, como resultado do período de “reconstrução dos direitos humanos iniciados no pós II Guerra”.
A partir daí, todas as nações foram se sensibilizando para este grave problema e introduziram em seus ordenamentos jurídicos normas e leis que resguardassem as crianças e adolescentes, pois por estarem em processo de formação é imprescindível garantir-lhes um desenvolvimento saudável e harmonioso.
No Brasil, a criação da Lei nº 8.069/1990, o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente representa um marco legal, fundamentado na proteção integral que reconhece toda Criança como sujeito de direitos. No art. 5º do estatuto, nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência , discriminação , exploração, violência, crueldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado , por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Dez anos após a criação do E.C.A, no Encontro Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes, ocorrido na cidade de Natal (RN), no ano de 2000, o Governo Federal juntamente com a Sociedade Civil, elaborou o Plano Nacional de Enfretamento a Violência Sexual contra Criança e Adolescentes, aprovado em julho do mesmo ano pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA).
Avaliando a trajetória de luta, desafios e avanços no enfrentamento a essa prática cruel de violência, que no Brasil já representam 27 anos de mobilização e combate, ainda me pergunto: estamos de fato na via certa? Digo isso pela complexidade que é o enfretamento a esse tipo de violência. Por mais que os Governos criem programas, serviços e ações de combate a este crime, não teremos resultados eficazes, enquanto a sociedade, através dos pais, educadores, instituições, comunidades não estivermos preparados e sensibilizados para lidar com essa problemática social. Corremos o grande risco de somente expor as “vítimas” a mais um constrangimento.
Reconhecemos significativos avanços, dentre eles: A qualificação dos profissionais que atendem nos programas, nas delegacias especializadas, na maioria da rede de atendimento e até mesmo nas Escolas. Os temas transversais orientam aos educadores a abordarem a Educação Sexual. Porém a raiz do problema encontra-se justamente na dificuldade de romper o preconceito, o falso moralismo, as dúvidas e as informações incorretas. Envolvendo varias questões, como por exemplo, algumas de cunho religioso marcantes e conflituosas, fato que faz esse conteúdo, muitas vezes ser omitido em sala de aula e ignorado pela maioria de educadores.
Não podemos aqui generalizar, encontramos Escolas em que seus profissionais sensibilizados pela a importância do assunto, exercem a militância no espaço escolar e na comunidade. Também não podemos julgar ou condenar a omissão de muitos, por não entenderem a complexidade do tema, somado à herança cultural e os tabus que foram transmitidos através de gerações. No entanto, por tratar-se de um fenômeno de grave violação de direito, a Escola tem o compromisso ético, moral e pedagógico de trabalhar na prevenção. Pois, não adianta garantir políticas públicas de atendimento e responsabilização se não existir um trabalho preventivo. Considerando-se que os casos chegam até o atendimento quando tornou-se público, outros tantos por medo, ameaça ou constrangimento não têm coragem de denunciar! Sofre no mais profundo silêncio.
Fica aqui o meu apelo a todos os colegas profissionais da área da Educação, em especial aqueles que se identificam com o tema e tem facilidade de trabalhar a temática, vamos assumir o compromisso de fazer um trabalho preventivo, inicialmente exigindo que nos projetos de formação continuada dos profissionais da educação contemplem como eixo temático a violência sexual contra crianças e adolescentes. Só assim estaremos exercendo o nosso verdadeiro papel de promover a cidadania através da informação ao educando sobre os seus direitos e deveres.
Conforme preconiza o Art. 227 da Constituição Federal, “ É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Em consonância com norma supramencionada a rede de proteção deve atuar de forma integrada para concretizar essas garantias.
Ao assegurarmos ações preventivas contra a violência sexual, possibilitaremos que as crianças e adolescentes tenham apoio e sejam protegidos com ações educativas com vistas à autodefesa, à conscientização, à valorização e respeito a suas etapas de crescimento.
Estudos e pesquisas comprovam que os danos e as seqüelas emocionais, físicas e sociais são graves e muitas vezes irreparáveis. Somente a união de todos pode contrapor a violência e assim estaremos contribuindo de fato para a dignidade das crianças e adolescentes. É preciso pensar como Paulo Freire: “Mudar é difícil, mas é possível”... Não vamos esperar que aconteçam outros crimes bárbaros e hediondos como o caso da Araceli Cabrera Crespo, de oito anos, que desapareceu da escola onde estudava para nunca mais ser vista com vida. A menina foi estupidamente martirizada, espancada, estuprada, drogada e morta numa orgia de drogas e sexo. Teve seu rosto desfigurado com ácido. Seis dias depois do massacre, o corpo foi encontrado num terreno baldio, próximo ao centro da cidade de Vitória, Espírito Santo. Seu martírio significou tanto que esta data se transformou no “Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes”. Instituído pela lei federal nº 9.970/00.
Antonia Eliene Liberato Dias, graduada em Geografia e Pós – graduada em Ensino da Geografia. Professora da Rede Pública Estadual de Ensino e atualmente Secretária Municipal de Assistência Social do Município de Cáceres.
Antonia Eliene Liberato Dias, graduada em Geografia e Pós – graduada em Ensino da Geografia. Professora da Rede Pública Estadual de Ensino e atualmente Secretária Municipal de Assistência Social do Município de Cáceres.
* Eliene Liberato, melhor Secretária de Ação Social do Brasil
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